sexta-feira, 1 de junho de 2018

CONTO - O CHÃO SULINO

         A LURA EDITORIAL neste ano lança “O CANTO DOS CONTOS” na 25ª Bienal Internacional do Livro que acontece no Pavilhão do Anhembi em São Paulo, de 03 a 12 de agosto de 2018.                                   


           
  Solicitaram-me um conto com certas exigências que tive que obedecer, caso contrário, não se encaixaria numa Antologia. E o que significa? Antologia é uma compilação de textos usada para categorizar coleções de obras curtas, tais como histórias breves e romances sintéticos, agrupados em um único volume para publicação. Neste caso, deverá ser um romance com apenas cinco páginas e no máximo 10.000 caracteres. 

O gênero textual que ora se apresenta caracteriza-se como Romance Histórico de Ficção. Trata-se de obra com conteúdo imaginário, mas parcialmente baseada em fatos reais. Como tal é ficção com enredo e personagens fictícios em um cenário histórico.
Por ser de narrativa curta, condensa e potencia no seu espaço todas as possibilidades da ficção, muito embora o cenário seja variado e a trama se desenrole em vários locais dos Estados do sul, tratando-se então de romance regionalista, indianista e histórico

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                                                               O Chão Sulino

Escolhi o gênero literário romance histórico em que a composição das personagens e narrativa ficcional esteja em concordância com fatos que realmente aconteceram. Procurei produzir um conto em que, no período de cem anos no chão sulino, apareçam a Revolução Farroupilha, a Guerra do Paraguai, a Revolução Federalista e a Guerra do Contestado. É muita história para pouco espaço, por isso procuro ser sucinta e não comentar sobre usos e costumes da época.
    
Nossa história acontece no intermédio de 100 anos -1816 – 1916.
São dois marcos importantes para o Estado brasileiro.
Em 1817 nasce no planalto serrano catarinense, numa aldeia de Xokleng, a ascendente de heróis de nosso conto. Nasce, um ano antes, na Alemanha, também um ascendente destes mesmos heróis.
Iniciemos com a história de um tropeiro e de uma indígena.                                                   
Nesta viagem parto hoje e chego ontem!
Cheguei a julho de 1816.


Tropeiros seguiam seu destino rumo à Capitania de São Pedro do Rio Grande do Sul. Jerônimo era o chefe da tropeada, acompanhado de vários peões de jornada. Depois da Serra do Espigão chegaram aos campos de cima da serra. Quando da travessia de um rio, caudaloso após a chuva, sofreram um acidente e o tropeiro chefe caiu no rio... Rodou com sua mula e foi tragado pela correnteza. 
Jerônimo desapareceu entre o turbilhão das águas e foi arrastado rio abaixo. Logo se desprendeu de sua mula, que retornou à margem e fugiu em disparada pelo matagal adentro, com o restante de sua carga amarrada aos tentos.
O tropeiro, com o ombro sangrando roubando-lhe as forças, enroscou-se num galho de uma árvore ribeirinha, cerca de quinhentas braças abaixo do ponto da travessia. Arrastou-se até a margem direita e recebeu ainda uma forte pancada de um tronco que descia, acertando-lhe a cabeça. Rastejou até um pequeno descampado e prostrou-se desmaiado.               
            Entre o pessoal da tropa, a consternação foi total. Os peões se dividiram, para que alguns procurassem o companheiro desaparecido enquanto outros prosseguiram viagem.
Jerônimo ficara muito tempo desacordado.  Como morto, ao relento, não viu a noite passar. Amanhece o dia e o sol enxuga-lhe a roupa e aquece o corpo. Acorda com lambidas do seu cão Pancho.
É encontrado por uma índia que o leva para um abrigo.
Foi envolto em peles, acomodado em seus próprios pelegos e coberto com seu precioso pala, recolhido das bruacas que não se perderam, por terem sido firmemente atadas à mula que acompanhava seu dono.
 Vagas de calafrio sacudiam-lhe o corpo. Permaneceu febril por muitos dias e noites. Cuidava que ainda estivesse com sua viola à mão e certa feita, balbuciou uns versos de amor que encantaram a moça que lhe fazia companhia. Usaram o seu próprio unguento, encontrado em seus pertences, soberano para curar chagas e fraturas.
Jerônimo, aos poucos ia se recuperando... Enquanto isso, com muito custo, reaprendeu a andar e tão logo conseguiu montar a sua mula, planejou empreender viagem retornando às suas atividades de tropeiro. Providenciou sua saída de junto dos silvícolas, com quem fizera sólida amizade. Com o tempo passou a compreender o linguajar dos nativos e a se entender com aquela gente, de quem dantes tivera uma diferente concepção.
Quando já estava quase restabelecido, os selvagens ofereceram-lhe uma índia como companheira, segundo os costumes vigentes nas tribos. Esta entrega era feita durante uma cerimônia que realizavam todos os anos.
Foi triste a despedida da índia Japira, mas era preciso partir. Deixou como presentes ao cacique um facão e uma machadinha, ferramentas de grande valia.
Índia Japira
            De acordo com os costumes de seu povo, Japira, depois da “Cerimônia da Irmanação”, passaria a ter um companheiro. Sua satisfação fora muito grande quando lhe destinaram o homem branco, a quem já se havia apegado. Maior o pesar, quando o viu preparando-se para seguir de volta ao seu povo.
Na madrugada da partida sentia uma dor profunda a corroer-lhe a alma. Nada impediu que a caravana composta de Jerônimo e mais dois indígenas empreendessem viagem. Quando teve a certeza da partida dos viajantes embrenhou-se na selva gesticulando e sussurrando algo incompreensível.
Mais três meses se passaram e a índia notou que teria um filho. Com efeito, no fim do outono de 1817 nasceu-lhe uma menina, uma kariboka – mestiça filha de branco com índio.

Neste intermédio foi proclamada a Independência do Brasil - 1822

A menina mestiça índia Kruro transformou-se numa linda jovem. Sua mãe, antes de morrer contou-lhe sobre sua ascendência.
Alemães chegam ao Rio Grande do sul a partir de 1824 quando vem junto o menino Mathias compondo a primeira leva de 39 imigrantes germânicos.
Esta imigração foi motivada pela necessidade de povoar o sul do Brasil, garantindo a posse do território. Além disso, outro objetivo da busca de alemães era recrutar soldados para reforçar o exército brasileiro, recém-independente.

Na Província do Rio Grande do Sul acontece a Revolução Farroupilha entre 1835 e 1845. Os gaúchos não mais suportavam mais o peso dos impostos cobrados pela corte do Brasil que tinha como Imperador Pedro I. 
Comandados por Bento Gonçalves os farrapos, entre eles Mathias, seguem para SC. Quase perece nos altiplanos catarinenses, mas sobrevive graças à ajuda de um fazendeiro que tinha entre seu pessoal de serviço, uma mestiça indígena, que se perdera dos seus. Surge mais um romance:- Mathias conhece Kruro e mais tarde a leva ao Rio Grande.  Viveram bem por certo tempo e tiveram um filho a quem deram o nome de Theodoro.
 Eis que mais uma guerra vem abalar a paz do sul. Muitos sulinos se viram em combate e como outros alemães, Mathias é convocado.



 Tantos brasileiros e entre eles o alemão Mathias luta na Guerra do Paraguai, que durou de 1864 a 1870. É um bom momento para lembrarmo-nos daquele que é considerado o maior conflito armado da América do Sul.    Era a Tríplice Aliança de Brasil, Uruguai e Argentina contra o Paraguai. Entre as causas havia desentendimentos quanto às fronteiras entre os países, a liberdade de navegação dos rios platinos e outras rivalidades históricas.
Theodoro já com 30 anos passa a morar nos campos de Palmas –naquela época 1870 – região contestada pelas Províncias de Santa Catarina e Paraná. Estabelece-se como posseiro em terras devolutas. Mais tarde este seu chão sagrado passa a pertencer ao Estado do Paraná.  
                                                                                       
Na outra década acontece a Abolição da Escravatura e a Proclamação da República brasileira.
Maragatos


Theodoro participa em 1894 da Revolução Federalista como Maragato, incorporado às tropas de Gumercindo Saraiva.  Uma guerra civil ocorreu no sul do Brasil logo após a Proclamação da República, instada pelos federalistas, grupo opositor que pretendia libertar o Rio Grande do Sul do poder do novo governo arbitrário. Eram os maragatos versus força dos pica-paus. Famoso foi o Cerco da Lapa no Paraná em que se embateram Federalistas contra os Legalistas do governo. O resultado foi a vitória governamental. Importante é que Theodoro volta ao lar.
Paraná e Santa Catarina não se entendem quanto os seus limites.
Um dos filhos de Theodoro – João cuida de seu pedaço de chão em terras contestadas. Em 1905 colhe erva mate no meio oeste catarinense.
Outro filho, Juvêncio - é empregado na construção da Estrada de ferro São Paulo/ Rio Grande. Por grave arbitrariedade, os colonos são expulsos de suas terras e seu meio de subsistência.

João e Juvêncio têm uma irmã, Maria, que se casa com um paranaense e sai de casa.
1908 - João perde as terras para a Companhia da Estrada de Ferro que expulsa os colonos de suas margens. É espoliado e se vê sem sua fonte de renda. Como tantos outros colonos sem trabalho, sofre as consequências de desmandos. Com isso vira chefe de um reduto de caboclos revoltosos que se irmanam e geram sério conflito. E o conflito vira guerra que se estende por quatro anos.

Na Guerra do Contestado, os chamados jagunços invadem propriedades nas terras do planalto serrano, meio-oeste e planalto norte catarinense.

Juvêncio perde o emprego na ferrovia, mas consegue trabalho como guarda costas de um fazendeiro que defendia suas propriedades, passíveis de serem invadidas pelos fanáticos, devotos de São João Maria. É o chamado, vaqueano.
O cunhado do Paraná, Inácio, é convocado como soldado de um destacamento militar que combate os revoltosos. 

Todos viram agentes na Guerra do Contestado, sujeitos da história.
O chefe jagunço João nas andanças conhece uma moça, Ana Rosa e com seu bando ao atacar sua casa, resolve poupá-la. Gosta da moça e tão logo teve oportunidade, volta para conversar e iniciar um namoro. .Em plena guerrilha pode surgir uma paixão. Coração não conhece guerra e não escolhe hora para entregar-se aos encantos de alguém que lhe impressione.
A população civil, da qual Ana Rosa faz parte, também é agente social na Guerra.
Angelina estava para se casar com Juvêncio quando os revoltosos levaram seu noivo. Como ele fugiu dos fanáticos que estavam acampados no planalto catarinense, região de litígio?
Madrugou e às 5 h da manhã foi lavar o rosto num riacho e viu refletida na água a chegada dos militares. Jogou-se ao chão e foi rolando grota abaixo e safou-se. Logo adiante ouviu o tiroteio das winchesters que arrasou o reduto e boa parte dos revoltosos arranchados. Continuou pela vida afora a levantar cedo porque foi o fato de ser madrugador que lhe salvou a vida. E o devolveu à Angelina e à esperança de dias melhores.
E a Guerra na região contestada termina em 1916 com o acorde dos limites entre Paraná e Santa Catarina.

Hummm... E até hoje esta história não está bem contada. Importa é que esta área abriga um povo aguerrido, congregado e batalhador.
            Assim deixamos inacabada esta história de encontros e desencontros, covardia e coragem, fanatismo, bravuras, fugas e grandes amores no chão sulino.
 Sinira Damaso Ribas         Sinira10@yahoo.com.br


Nota: As publicações deste Blog podem ser utilizadas pelo(a) interessado(a), desde que citada a fonte: RIBAS, Sinira Damaso. Nome da postagem in blog Sinira Ribas , Disponível em http://lsinira10.blogspot.com.br


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