A LURA EDITORIAL neste ano lança “O CANTO DOS CONTOS” na 25ª Bienal Internacional do Livro que acontece no Pavilhão do Anhembi em São Paulo, de 03 a 12 de agosto de 2018.
Solicitaram-me um conto com certas exigências que tive que obedecer, caso contrário, não se encaixaria numa Antologia. E o que significa? Antologia é uma compilação de textos usada para categorizar coleções de obras curtas, tais como histórias breves e romances sintéticos, agrupados em um único volume para publicação. Neste caso, deverá ser um romance com apenas cinco páginas e no máximo 10.000 caracteres.
O
gênero textual que ora se apresenta caracteriza-se como Romance Histórico de
Ficção. Trata-se de obra com conteúdo imaginário,
mas parcialmente baseada em fatos reais. Como tal é ficção com enredo e personagens
fictícios em um cenário histórico.
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O
Chão Sulino
Escolhi o
gênero literário romance histórico em que a composição
das personagens e narrativa ficcional esteja em concordância com fatos
que realmente aconteceram. Procurei produzir um conto em que, no período de cem
anos no chão sulino, apareçam a Revolução Farroupilha, a Guerra do Paraguai, a
Revolução Federalista e a Guerra do Contestado. É muita história para pouco
espaço, por isso procuro ser sucinta e não comentar sobre usos e costumes da
época.
Nossa história acontece no intermédio
de 100 anos -1816 – 1916.
São dois marcos importantes para o
Estado brasileiro.
Em 1817 nasce no planalto serrano
catarinense, numa aldeia de Xokleng, a ascendente de heróis de nosso conto.
Nasce, um ano antes, na Alemanha, também um ascendente destes mesmos heróis.
Iniciemos com a história de um
tropeiro e de uma indígena.
Nesta viagem parto hoje e chego ontem!
Cheguei a julho de 1816.
Jerônimo desapareceu entre o turbilhão
das águas e foi arrastado rio abaixo. Logo se desprendeu de sua mula, que
retornou à margem e fugiu em disparada pelo matagal adentro, com o restante de
sua carga amarrada aos tentos.
O tropeiro, com o ombro sangrando
roubando-lhe as forças, enroscou-se num galho de uma árvore ribeirinha, cerca
de quinhentas braças abaixo do ponto da travessia. Arrastou-se até a margem
direita e recebeu ainda uma forte pancada de um tronco que descia,
acertando-lhe a cabeça. Rastejou até um pequeno descampado e prostrou-se
desmaiado.
Entre
o pessoal da tropa, a consternação foi total. Os peões se dividiram, para que
alguns procurassem o companheiro desaparecido enquanto outros prosseguiram
viagem.
Jerônimo ficara muito tempo
desacordado. Como morto, ao relento, não
viu a noite passar. Amanhece o dia e o sol enxuga-lhe a roupa e aquece o corpo.
Acorda com lambidas do seu cão Pancho.
É encontrado por uma índia que o leva
para um abrigo.
Foi envolto em peles, acomodado em
seus próprios pelegos e coberto com seu precioso pala, recolhido das bruacas
que não se perderam, por terem sido firmemente atadas à mula que acompanhava
seu dono.
Vagas de calafrio sacudiam-lhe o corpo. Permaneceu
febril por muitos dias e noites. Cuidava que ainda estivesse com sua viola à
mão e certa feita, balbuciou uns versos de amor que encantaram a moça que lhe
fazia companhia. Usaram o seu próprio unguento, encontrado em seus pertences,
soberano para curar chagas e fraturas.
Jerônimo, aos poucos ia se
recuperando... Enquanto isso, com muito custo, reaprendeu a andar e tão logo
conseguiu montar a sua mula, planejou empreender viagem retornando às suas
atividades de tropeiro. Providenciou sua saída de junto dos silvícolas, com
quem fizera sólida amizade. Com o tempo passou a compreender o linguajar dos
nativos e a se entender com aquela gente, de quem dantes tivera uma diferente
concepção.
Quando já estava quase
restabelecido, os selvagens ofereceram-lhe uma índia como companheira, segundo
os costumes vigentes nas tribos. Esta entrega era feita durante uma cerimônia
que realizavam todos os anos.
Foi triste a despedida da
índia Japira, mas era preciso
partir. Deixou como presentes ao cacique um facão e uma machadinha, ferramentas
de grande valia.
Índia
Japira
De
acordo com os costumes de seu povo, Japira, depois da “Cerimônia da Irmanação”,
passaria a ter um companheiro. Sua satisfação fora muito grande quando lhe
destinaram o homem branco, a quem já se havia apegado. Maior o pesar, quando o
viu preparando-se para seguir de volta ao seu povo.
Na madrugada da partida
sentia uma dor profunda a corroer-lhe a alma. Nada impediu que a caravana
composta de Jerônimo e mais dois indígenas empreendessem viagem. Quando teve a
certeza da partida dos viajantes embrenhou-se na selva gesticulando e
sussurrando algo incompreensível.
Mais três meses se
passaram e a índia notou que teria um filho. Com efeito, no fim do outono de 1817
nasceu-lhe uma menina, uma kariboka –
mestiça filha de branco com índio.
Neste intermédio foi proclamada a
Independência do Brasil - 1822
A menina mestiça índia Kruro transformou-se numa linda jovem.
Sua mãe, antes de morrer contou-lhe sobre sua ascendência.
Alemães chegam ao Rio
Grande do sul a partir de 1824 quando vem junto o menino Mathias compondo a
primeira leva de 39 imigrantes germânicos.
Esta
imigração foi motivada pela necessidade de povoar o sul do Brasil, garantindo a
posse do território. Além disso, outro objetivo da busca de alemães era
recrutar soldados para reforçar o exército brasileiro, recém-independente.
Na Província do Rio Grande
do Sul acontece a Revolução Farroupilha entre 1835 e 1845. Os gaúchos não mais suportavam mais o peso dos
impostos cobrados pela corte do Brasil que tinha como Imperador Pedro I.
Comandados por Bento
Gonçalves os farrapos, entre eles Mathias, seguem para SC. Quase perece nos
altiplanos catarinenses, mas sobrevive graças à ajuda de um fazendeiro que
tinha entre seu pessoal de serviço, uma mestiça indígena, que se perdera dos
seus. Surge mais um romance:- Mathias conhece Kruro e mais tarde a leva ao Rio
Grande. Viveram bem por certo tempo e
tiveram um filho a quem deram o nome de Theodoro.
Eis que mais uma guerra vem abalar a paz do
sul. Muitos sulinos se viram em combate e como outros alemães, Mathias é
convocado.
Tantos brasileiros e entre eles o alemão
Mathias luta na Guerra do Paraguai, que durou de 1864 a 1870. É um bom momento
para lembrarmo-nos daquele que é considerado o
maior conflito armado da América do Sul. Era
a Tríplice Aliança de Brasil, Uruguai e Argentina contra o Paraguai. Entre as causas havia desentendimentos quanto às fronteiras entre os países, a liberdade de navegação dos rios platinos e outras rivalidades
históricas.
Theodoro já com 30 anos
passa a morar nos campos de Palmas –naquela época 1870 – região contestada
pelas Províncias de Santa Catarina e Paraná. Estabelece-se como posseiro em
terras devolutas. Mais tarde este seu chão sagrado passa a pertencer ao Estado
do Paraná.
Na outra década acontece a Abolição da
Escravatura e a Proclamação da República brasileira.
Theodoro participa em 1894 da
Revolução Federalista como Maragato, incorporado às tropas de Gumercindo
Saraiva. Uma guerra civil ocorreu no sul do Brasil logo após
a Proclamação
da República, instada pelos federalistas,
grupo opositor que pretendia libertar o Rio Grande do Sul do poder do
novo governo arbitrário. Eram
os maragatos versus força dos pica-paus. Famoso foi o Cerco da Lapa no Paraná
em que se embateram Federalistas contra os Legalistas do governo. O resultado
foi a vitória governamental. Importante é que Theodoro volta ao lar.
Paraná e Santa Catarina
não se entendem quanto os seus limites.
Um dos filhos de Theodoro – João cuida de seu pedaço de chão em
terras contestadas. Em 1905 colhe erva mate no meio oeste catarinense.
Outro filho, Juvêncio - é empregado na construção
da Estrada de ferro São Paulo/ Rio Grande. Por grave arbitrariedade, os colonos
são expulsos de suas terras e seu meio de subsistência.
João e Juvêncio têm uma
irmã, Maria, que se casa com um
paranaense e sai de casa.
1908 - João perde as
terras para a Companhia da Estrada de Ferro que expulsa os colonos de suas
margens. É espoliado e se vê sem sua fonte de renda. Como tantos outros colonos
sem trabalho, sofre as consequências de desmandos. Com isso vira chefe de um
reduto de caboclos revoltosos que se irmanam e geram sério conflito. E o
conflito vira guerra que se estende por quatro anos.
Na Guerra do Contestado,
os chamados jagunços invadem propriedades nas terras do planalto serrano,
meio-oeste e planalto norte catarinense.
Juvêncio perde o emprego na ferrovia, mas
consegue trabalho como guarda costas de um fazendeiro que defendia suas
propriedades, passíveis de serem invadidas pelos fanáticos, devotos de São João
Maria. É o chamado, vaqueano.
O cunhado do Paraná, Inácio, é convocado como soldado de um destacamento
militar que combate os revoltosos.
Todos viram agentes na
Guerra do Contestado, sujeitos da história.
O chefe jagunço João nas andanças conhece uma moça, Ana Rosa e com seu bando ao atacar sua
casa, resolve poupá-la. Gosta da moça e tão logo teve oportunidade, volta para
conversar e iniciar um namoro. .Em plena guerrilha pode surgir uma paixão. Coração
não conhece guerra e não escolhe hora para entregar-se aos encantos de alguém
que lhe impressione.
A população civil, da qual
Ana Rosa faz parte, também é agente
social na Guerra.
Angelina estava para se casar com Juvêncio quando os revoltosos levaram
seu noivo. Como ele fugiu dos fanáticos que estavam acampados no planalto
catarinense, região de litígio?
Madrugou e às 5 h da manhã foi lavar o
rosto num riacho e viu refletida na água a chegada dos militares. Jogou-se ao
chão e foi rolando grota abaixo e safou-se. Logo adiante ouviu o tiroteio das winchesters
que arrasou o reduto e boa parte dos revoltosos arranchados. Continuou pela
vida afora a levantar cedo porque foi o fato de ser madrugador que lhe salvou a
vida. E o devolveu à Angelina e à esperança de dias melhores.
E a Guerra na região
contestada termina em 1916 com o acorde dos limites entre Paraná e Santa
Catarina.
Hummm... E até hoje esta história não está bem contada. Importa é que esta área
abriga um povo aguerrido, congregado e batalhador.
Assim
deixamos inacabada esta história de encontros e desencontros, covardia e
coragem, fanatismo, bravuras, fugas e grandes amores no chão sulino.
Sinira
Damaso Ribas Sinira10@yahoo.com.br
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a fonte: RIBAS, Sinira Damaso. Nome da postagem in blog Sinira
Ribas , Disponível em http://lsinira10.blogspot.com.br